POLÍTICA, SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO | OPINIÃO

terça-feira, 26 de abril de 2011

O DISCURSO DE UMA GERAÇÃO


Ao longo dos anos os países desenvolvidos cresceram e desenvolveram-se gastando mais do que aquilo que tinham, mais do que aquilo que produziam, gerando uma despesa anual (défice) que diziam controlada. Uma despesa assente em programas de governo e linhas mestras que promoviam o progresso económico e o bem-estar social e que seria abatida paulatinamente com o esperado crescimento económico, acima de 2% (aquele que gere emprego). Mas em três décadas, o défice passou a endividamento. A título de exemplo, segundo o Banco de Portugal, o endividamento público no ano 2000 era de 48,7% do PIB e em 2010 é de 83% do PIB. Um endividamento brutal criado pelos órgãos de estado, a que se junta um crescimento ao nível de endividamento das famílias (o acesso ao crédito ao consumo e ao crédito hipotecário). Simultaneamente, a taxa de poupança nacional passou de 20% no ano de 2000 para 10% em 2010, uma poupança insuficiente que aumenta a necessidade de recorrer ao financiamento externo (sobretudo no sistema bancário) e que aumenta, ainda, mais a dependência de Portugal face aos credores externos.

Todavia, esta situação não é exclusivamente portuguesa, muito pelo contrário, a grande maioria dos países europeus apresentam neste momento níveis de endividamento semelhantes (a média do endividamento dos países da UE é de 94%), assim como elevadas taxas de desemprego. A única e grande diferença, é que essa grande maioria de países tem uma economia mais forte, mais competitiva e que melhor responde aos problemas. Existe uma divergência económica entre Portugal e o resto dos países da União Europeia.

Por isso, as nossas atenções devem-se concentrar naquele que é hoje o grande problema do nosso país, a ausência de crescimento económico que gere emprego e riqueza. Este deve ser o discurso de uma geração, da minha, da geração dos meus pais, da geração de mais de 700 mil desempregados. O trabalho dignifica as pessoas e cria riqueza, e esta permite sustentar políticas de emprego e de protecção social. É imprescindível encontrar o caminho do crescimento. Mas como é que deve ser feito esse caminho? Como pode Portugal crescer? Que sectores vão criar emprego? Qual pode ser a nossa vantagem competitiva na Europa e no Mundo? Estas são as perguntas às quais se deve encontrar uma resposta, um programa de Governo e a partir das quais se deve alterar todo o quadro em que se move a economia.

É preciso devolver aos portugueses a cana de pesca, para que possam voltar a pescar e basta de colocar o peixe em cima da mesa. O poder da iniciativa deve ser o suporte de uma nova política de crescimento. O poder da iniciativa acompanhada por legislação que incentive o risco e que projecte a criatividade e o empreendedorismo. O poder da iniciativa lado a lado com o conhecimento e a investigação. Essa tem de ser, neste momento, a prioridade para criarmos motores de crescimento económico.

Contudo, nada do que é importante poderá ser concretizado senão reforçarmos a estabilidade política. Neste momento, o Governo faz aquilo que pode, coloca as contas públicas em ordem (baixou o défice para a casa dos 6,8%, segundo as anteriores regras metodológicas), aumenta e diversifica o volume das exportações (que alavancaram a nossa economia em 1,4% em 2010) e segue um rigoroso e austero programa de redução do défice.

As medidas de austeridade incidem em dois factores: no aumento da receita (impostos) e também na redução da despesa. E na minha opinião deve centrar-se na redução da despesa, e aliviar os impostos sobre o rendimento, porque o consumidor está hoje numa situação delicada. Mas também é preciso dizer verdade e extinguir determinadas empresas, instituições e serviços públicos significa despedir funcionários (relembro que o Governo do PS extinguiu 25% dos institutos e organismos públicos e com eles 70 mil funcionários em 6 anos). Mas é exactamente a partir daqui que podemos publicamente debater em torno de um plano de médio e longo prazo porque todos precisamos de um programa estável e corajoso que dê continuidade a reformas importantes, iniciadas no primeiro governo de José Sócrates.

Os problemas do país (que se agravaram após os efeitos da crise internacional), resultantes do endividamento, dos vícios do estado e da interrogação à volta de um modelo de desenvolvimento económico são demasiado complexos para serem resolvidos com atitudes voluntaristas, centralistas e agressivas. “Não temos todos de ser amigos mas temos a obrigação de saber trabalhar em conjunto para o bem comum, dos políticos aos empresários, dos funcionários públicos ao cidadão comum. Há países capazes de o fazer. Portugal também tem de ser capaz” (Helena Garrido). Capaz de reescrever o seu caminho. E na minha opinião, só o discurso de uma geração com mais de 700 mil desempregados o pode fazer, só o discurso de uma geração com as maiores qualificações de sempre o pode concretizar, só uma geração política humilde e capaz de se entender pode alterar o paradigma em que vivemos.